Bebê gerada após seleção genética doa medula à irmã
Maria Clara, gerada após seleção genética doa medula à irmã Maria Vitória, 6
Maria Vitória, 6, nasceu com talassemia major, uma doença
hereditária que prejudica a produção de glóbulos vermelhos. A cada três
semanas, tinha que receber "sanguinho", termo usado por seus pais
para se referir às transfusões frequentes.
Há um ano e dois meses, ela ganhou a irmã que tanto pediu
aos pais e que poderia ajudá-la a se ver livre da doença por meio de uma doação
de células-tronco.
Maria Clara, a irmã mais nova, foi gerada a partir de um
embrião selecionado em um tratamento de fertilização in vitro feito pelos pais.
A seleção buscou embriões sem a talassemia major e
compatíveis para um transplante de células-tronco. O procedimento trazia uma
chance de até 90% de cura para Maria Vitória.
Por isso, quando a mais nova nasceu, as células-tronco de
seu cordão umbilical foram colhidas e congeladas.
Bebê gerada após seleção genética doa medula à irmã
Maria Clara, gerada após seleção genética doa medula à irmã
Maria Vitória, 6, que nasceu com uma doença hereditária
Mas, como o número de células-tronco do cordão não era
suficiente para o transplante, considerando o peso da mais velha, foi preciso
esperar até que a caçula crescesse um pouco mais para que também fossem
retiradas as células-tronco de sua medula óssea por uma punção no osso ilíaco,
na bacia.
Há 22 dias, o transplante finalmente foi feito. E, nesta
semana, apresentou resultados: a medula óssea de Maria Vitória teve
"pega", ou seja, passou a produzir suas células de maneira saudável.
Antes de receber o transplante, ela foi submetida a uma
forte quimioterapia para "destruir" sua medula óssea doente. As
células doadas pela irmã repovoaram sua medula para que ela funcionasse de
maneira normal.
A químio causou reações indesejadas, como náuseas e queda de
cabelo, mas seu efeito mais grave (e discutido com os pais) é a infertilidade.
Segundo o médico responsável pelo transplante de Maria
Vitória, Vanderson Rocha, do Sírio-Libanês, a chance de a menina ter filhos no
futuro é pequena porque 95% dos pacientes submetidos a esse procedimento ficam
inférteis.
Esse foi o primeiro caso na América Latina de seleção de
embriões livres de doenças genéticas e compatíveis para um transplante.
O geneticista Ciro Martinhago foi o responsável pela seleção
dos embriões. Segundo ele, o caso abre brecha para que outras doenças também
possam ser tratadas dessa maneira, como a leucemia. Depois do nascimento de
Maria Clara, Martinhago já usou o método em outros 20 casos, a maioria para
talassemia major e anemia falciforme.
Para o médico, o importante é ter a certeza de que a família
quer mais um filho, independentemente da ajuda que ele possa oferecer a um
irmão doente.
"Não pode haver o desejo de ter o filho para curar o
irmão. A criança não pode se sentir usada dessa maneira. Os pais que atendo me
dizem que, se não for possível fazer a seleção, vão querer ter o filho de
qualquer jeito."
CURA POSSÍVEL
O médico Vanderson Rocha afirma que Maria Vitória será
acompanhada de perto por um bom tempo e só será possível falar em cura
definitiva daqui a um ano.
Os pais das meninas, porém, já comemoram.
"Sempre pensei que, se houvesse uma chance de cura para
a Maria Vitória, eu não ficaria de braços cruzados. Não consigo descrever a
sensação de meta cumprida", diz a biomédica Jênyce Reginato da Cunha, 36,
mãe das meninas.
A rotina de transfusões começou quando a filha tinha cinco
meses. A mãe conta que a menina sempre considerou o procedimento
"normal", mas, há um ano, começou a reclamar e a não querer mais se
submeter às picadas.
Antes do transplante, ela já vinha apresentando excesso de
ferro no fígado, uma consequência das transfusões que pode causar cirrose e
insuficiência cardíaca.
Hoje, Maria Vitória terá alta do Hospital Sírio-Libanês,
onde fez o transplante e morou durante um mês.
Cansada da rotina do hospital e com saudade da casa da
família, em Cerquilho (SP), deixará para trás um quarto todo decorado com
adesivos e pôsteres da novela "Carrossel" --especialmente da
personagem Maria Joaquina, interpretada pela atriz Larissa Manoela, que ela
sonha em conhecer.
Fonte: Folha de São Paulo por Mariana Versolato
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